quinta-feira, 12 de novembro de 2015

A trope dos personagens que juram que são bons

Eu assisto séries, e isto foi estabelecido lá atrás, ainda no primeiro post do blog. Eu assisto séries e pro padrão de muita gente, eu assisto série demais. Pra um padrão menor de pessoas, eu assisto poucas e sou um peixinho em desenvolvimento. Mas a questão é: eu assisto séries. E eventualmente assisto filmes e leio livros. E se tem uma coisa que nunca falha em me fazer revirar os olhos, é A Trope. A Trope dos personagens (homens) que juram que são boas pessoas.

O Urban Dictionary define:


Trope on the interwebs really refers to an often overused plot device. It can also be described as another variation on the same theme. TV shows, movies, comics, games, anime', & books are full of tropes & many rabid fan-sites now name & track said tropes with a self-explanatory title for each one. Not all tropes are bad, until Hollywood gets stuck on one.

No meu currículo seriador e cinéfilo tem um pouco de tudo e é constante que me deparo com os seguidores fictícios desse modo de vida. Talvez por preguiça ou desleixo dos escritores, ou ainda por acreditarem que os telespectadores vão deixar esse estereótipo passar batido (só que não, porque nem sempre), a facilidade em cair num clichê wannabe-good é enorme.

Nos livros, sinto que a pegada é mais forte. Eu encontro essa problemática em diversos tipos de gêneros e estilos literários, em especial no meu gênero favorito (young adult), o que por uma série de fatores pode ser preocupante, mas é assunto pra outra hora.

No geral, os bonitinhos desse grupo possuem uma ou a maioria das seguintes características:

1) A ILUSÃO DE QUE SÃO HERÓIS
Finn Collins (The 100) e Francis (Reign) 
Eles juram de pé junto que são heróis. Eles querem muito provar que são heróis. Eles querem salvar a dama em apuros enquanto ganham aquela focada da câmera que diz pro telespectador que: "ele é um herói, ela vai amar ele".

Além de reforçar um padrão ultrapassado de que toda mulher quer um herói, eles realmente acreditam que são dignos de mais atenção porque ajudaram alguém que desmaiou ou estava prestes a ser estraçalhada por selvagens radioativos. Eles querem ser heróis porque ser uma pessoa decente é muito pouco  ̶̶̶̶̶̶̶̶  e de tão pouco, nem isso eles conseguem.


2) SÍNDROME DE ÚLTIMA BOLACHA DO PACOTE
Ted Mosby (How I Met Your Mother) e Tom Hansen (500 Days of Summer)
Como assim ela não me quer? Eu, que salvei ela? Eu, que sou estudado? Eu, que sou trabalhador? Eu, que dei tudo pra ela? Eu, que amo ela? Eles pensam que por fazerem coisas normais, que por sentirem seja lá o que eles sentem, o outro, ou, na maioria das vezes, a outra, tem que sentir o mesmo. Tem que reconhecer tudo isso e ir mais além: corresponder a isso da forma que eles pensam ser certo.

Em uma palestra que assisti essa semana, a psicóloga muito didaticamente explicou que nós somos responsáveis pelo que sentimos. Se a gente sente raiva, a gente sente isso. Quando dizemos “eu te amo”, quem ama somos nós. É claro que desenvolvemos e lidamos com sentimentos de maneiras diferentes, que nos encantamos pelo outro, mas a real é que aquilo que sentimos é nosso e inteiramente nosso. E a frustração, principalmente a masculina, ocorre por não aceitar que a outra pessoa não sinta o mesmo ou sinta de uma maneira diferente à dele.

Nota de rodapé: nesse bolo, a mistura ainda inclui o fato da paixão (que leva mais ou menos dois anos para dissipar) iludir e deformar a realidade. O homem apaixonado quer dar tudo para a mulher, e quando essa fase passa (paixão) ele percebe que tudo o que ele ofereceu pra mulher muitas vezes ele não é capaz de manter. Então ele passa a enxergar a realidade e ressentir, e a mulher a quem ele deu de tudo, não mais que de repente, é a bruxa que não dá valor pra ele.


3) MARCAM TERRITÓRIO COMO SE FOSSEM CACHORROS
Ross Geller (Friends) e Stefan Salvatore (The Vampire Diaries)
Disparado uma das atitudes mais marcantes desses personagens é a falta de capacidade que eles têm em aceitar que o outro sinta de outra forma que não a dele. Assim sendo, ao perceber que a moça a quem eles tanto se dedicaram não corresponde mais aos seus sentimentos ou corresponde ao sentimento de outro já é motivo o suficiente pra colocar Os Heróis, em primeiro momento, na defensiva. Aqui eles são rápidos em soltar frases como “o que você quer com ele?” ou mesmo a clássica “você não sabe o que tá fazendo!”, porque é óbvio que eles sabem mais e mais óbvio ainda, sabem melhor.

Em segundo momento, a escrita viciosa dos responsáveis por esses personagens vai colocar eles em posição antagônica à algum outro personagem (e este, eu aposto, é o dito bad boy)  ̶̶̶̶̶̶̶̶  foi por causa dele que o meu amor (what a bitch!) me deixou. É aqui que virão as confrontações, mimos e mijadas pra marcar território, que tentam dizer que “ela é minha”, mas que só traduzem o quanto elas não são deles.


4) TUDO SE JUSTIFICA SE EM NOME DO AMOR
Dean Forester (Gilmore Girls) e George Tucker (Hart of Dixie)
Eles não ligam se assumiram um compromisso monogâmico de estar com outra pessoa. Não ligam se estão casados. Não ligam se alimentaram um relacionamento por anos a finco, construíram uma vida ou prometeram o amor da vida àquela com quem juntaram suas escovinhas de dente. Basta uma faísca com outro alguém e pronto. “Você é o amor da minha vida”. “You’re the one”. “Eu te procurei durante toda a minha vida”.

E olha, eu não acredito que tenhamos que ficar com alguém pra sempre porque aquilo era o que sentimos em determinado momento. Mas eu não acredito em traição, e se você assume algo, assuma. Lide com isso. Termine o relacionamento se o que tu queres é ficar com o (outro) amor da sua vida. Contudo, isso é algo que definitivamente não acontece com esses personagens. Tudo é justificável em nome do amor, desde que favorável a eles.

Quando isso acontece, e acredite, acontece, os responsáveis pelo romance utilizam uma técnica porca na hora de trazer o relacionamento oficial a tona: introduzem a parceira na trama só após aquela troca de olhares de estremecer a base, ou o beijão de cinema, ou aquele sexo maravilhoso entre o novo amor e o Mala Sem Alça. E nem vamos debater sobre quando tentam fazer com que a esposa/namorada oficial seja tudo o que há de ruim no mundo, né?

Para além da técnica porca, a escrita suja de certos seriados com frequência gasta vinte e sete episódios fingindo que constrói um personagem com princípios, pra logo no episódio seguinte colocar ele em posição de pressão ou medo de perder a amada, e transformar o já muito péssimo boy, em um boy sem noção. Que mata a troco de nada. Que esquece dos amigos que tanto estimava. Que consegue se afundar ainda mais no poço sem fundo que ele já se encontrava.

Depois que a porcaria foi feita, os dito cujos vêm com o rabo entre as pernas, fazendo cara de cachorro coitado que além de mijar pra marcar território, também foi pego estragando os móveis, e soltam um “eu nunca quis te magoar”. Sinceramente... Por favor, viu?

***

Na hipótese óbvia, esses personagens são machistas. Eles deitam na cama dizendo a si mesmos que são bons, ou injustiçados, e que não merecem a torta de climão que comem quando os dois amores da vida dele se encontram em um mesmo cômodo.

Eles são o equivalente da vida real daqueles que choram porque são colocados em friendzones (que nem existem), ou que por serem tão legais e superiores são incompreendidos e por isso a mulher que eles “amam” não ama eles de volta.

De tempos em tempos, eu caio na armadilha desse antro de chatos. Minha lista de problematic faves, tanto de personagens quanto de ships, it’s a thing and it exists, e embora eu critique e não consiga defender, não consigo des-shipar, e vez que outra quando vejo gifs de certos momentos acabo toda derretida por dentro (Blair e Chuck, Barney e Robin: eu tô olhando pra vocês). No entanto, pra minha felicidade, ultimamente meu Radar de Insuportável apita rápido e apita alto, e quando me dou por conta estou revirando os olhos pra dentro da cabeça que chego a precisar de ajuda pra virar eles de volta; ou amaldiçoando as amebas até não poder mais; ou não muito sutilmente desejando uma estaca no meio do rabo desses trastes.

Não tenho vontade nem mais energia pra defender o quão acho importante e válido as pessoas amarem, adorarem ou terem um interesse por diferentes formas de entretenimento  ̶̶̶̶̶̶̶̶  livro, séries e seriados, filmes, novelas  ̶̶̶̶̶̶̶̶ , e a certo nível o quanto isso se enraizou na cultura mundial. Dizer que não pode se importar “porque não é real”, hoje em dia, em mim, entra num ouvido e sai no outro.

Por ter quebrado com essa ideia do “não pode porque não é real”, dói e irrita assistir esse grupo de personagem reiterando atitudes e discursos que eu promovo evitar na minha vida. Incomoda saber que, há anos, os escritores acreditam ser ‘ok’ e ser ‘normal’ reproduzir tais comportamentos  ̶̶̶̶̶̶̶̶  e reproduzirem isso à milhares de pessoas.

E sim, eu continuo achando extremamente prazeroso ler ou assistir série e filme. Não vou desistir porque tem coisa errada no meio (só se tiver coisa errada demais e se torne chato, hehe), pois se fosse fácil assim, a vida deveria ter um passe-livre pra desistência.

E enquanto eu tirar prazer disso, enquanto eu me interessar por isso, eu vou criticar, problematizar e fazer cara feia, porque that's my jeitinho. O carinho que eu tenho por uma série ou um personagem, problemático ou não, não me faz passar a mão na cabeça, muito pelo contrário, eu vou analisar ainda mais seus erros e acertos.

No mais, colocando de lado a realidade cofrinho de dinheiro dessa indústria, vou desejar muita luz pros produtores de entretenimento, pra que eles possam enxergar que aquela criatura que eles moldam com palavras num script pode ser mais, pode ser melhor, pode ser tridimensional, e pode, pelo amor de R’hllor, não ser um clichê tão ruim.


Obs.: CW é meu karma. 
Obs. 2: alguns dos personagens ilustrados são personagens que até gosto (a grande parte eu odeio), mas a maioria deles se aplica em todas as características. A ordem das fotos não altera o resultado. 

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Be - espinha ereta - Yoncé

Mamãe me xinga quando me vê no PC. Isso, no PC mesmo. Algo dentro de mim é muito oldschool, e também pobre, porque eu não tenho notebook. Eu Ana. Meu pai tem o dele que atualmente está com a minha irmã em terras porto alegrenses, mas eu não tenho notebook, eu gosto é de PC. 

Mas minha mãe me xinga quando me vê no PC. E eu sei que vocês sabem o porquê. Não deve ser só eu. Duvido que seja só eu. A história clichê vai mais ou menos assim: em um momento está a Ana sentada certinha, dando orgulho aos fisioterapeutas por aí, e então, 47 segundos depois, cortando a cena, tem uma Ana muito mal sentada na frente do PC, dando orgulho aos meus ancestrais corcundas. 

Então a mãe entra na cena e "ANA CLAUDIA AJEITA ESSA COLUNA", aí a Ana diz "sim aff mãe". E 47 segundos depois... Bem, vocês pegaram a ideia.


O problema é: postura é bom, é importante, há bocas que dizem que nosso corpo trabalha melhor e nós cansamos menos quando estamos com a postura correta, mas eu tô penando muito tentando educar a minha. 

Por ter um nível baixo de escoliose anos atrás, eu comecei sessões de RPG (reeducação postural global) quinzenalmente. Não era muito, mas ajudava. Gostaria muito de voltar, mas o valor não é muito doce e eu tenho faculdade pra pagar. Mas ajudava. Eu sentia que ajudava, apesar de sofrer muito durante aquela hora que ficava lá. Aquela combinação de eu, mais a fisio, mais uma bola de pilates, muitas cordas, e uma maca... Era louco. Parece sadomaso mas é só RPG. E ajudava. 

Mas então eu cresci, minha fisioterapeuta parou de atender, eu comecei a trabalhar (no PC, obviamente), e o downhill foi grande. Meu vício de usar o PC não passou, então quando não estou usando no trabalho, talvez eu esteja usando em casa rebloggando foto de cachorro no tumblr. Alguns anos depois eu ganhei um smartphone e comecei a poder checar o Instagram e o Facebook sem me estressar em abrir os sites no PC (eu ainda abria), então o pescocinho começou a se ocupar olhando pra baixo pra dar uma checadinha. Só que o smartphone não era tão bom, então eu comprei um celular decente. E aí eu tinha (e ainda tenho) tudo a cinco cliques de distância. Instagram, Facebook, Twitter, Tumblr, Whatsapp, Kim Kardashian e Candy Crush. Graças a tecnologia, o vício no PC não só não passou mas como também eu ganhei outro. Adicionado nessa mistura ainda tem meu adorado vício em assistir TV  ̶̶̶̶̶̶̶̶  que não ajuda; minha impossibilidade de estudar com gente junto   ̶̶̶̶̶̶̶̶  o que me faz estudar em cima da cama, Torta Daquele Jeito; mais meu vergonhoso sedentarismo, que só piora tudo.

Eu comecei a sentir reflexos disso tudo, é claro. As dores nas costas são mais recorrentes. Às vezes meus ombros doem tanto e tensionam tanto que só a base de massagem e Tandrilax (tá aí um jabá que me faria feliz) pra resolver (ou enganar) um pouco. Semana passada comecei a sentir dor no punho e mão direita. Ou seja, um pacote meio desesperador pra alguém que pretender viver muito que nem eu. 

Então há algumas semanas eu comecei a me monitorar. Tentar ajeitar minha postura. Passo minutos me encarando no espelho e vendo as diferenças corporais que acontecem quando eu fico normal (tortinha) e quando eu fico reta. Quando coloco uma roupa mais bonitinha aí sim a diferença é gritante  ̶̶̶̶̶̶̶̶  experimentei com um vestido bonito que comprei e fiquei chocada. Porque sim, postura é importante, mas aff, é tão difícil de ajeitar. 

Comecei a procurar exercícios na internet pra melhorar a postura em casa. Hoje baixei um aplicativo no celular, que ainda não testei, que ensina exercícios de 15 minutos pra fazer por dia e melhorar a coluninha. Quando eu passo na frente de espelhos e vidros que dão reflexos, não, eu não tô me admirando ou me achando linda, eu só estou checando a minha postura. Eu até criei um mantra maravilhoso que diz que "Beyoncé não gostaria disso, eu sou Beyoncé quando tô com a postura reta". Então quando eu fico que nem uma estranha me ajeitando na rua, é porque a minha mente tá dizendo "Seja Beyoncé. Be Yoncé. Isso não é muito Beyoncé de você, Ana Claudia", e eu juro que é tão eficaz quanto a mamãe gritando pra eu ajeitar a coluna. 
© AAAAAA
Maira Gall